domingo, setembro 4

Futebol - Guerras de Alecrim e Manjerona...



Viver as emoções de qualquer evento desportivo é, sem ponta de dúvida, um daqueles momentos que marcam pelo jeito como se reage, de forma quase impensada, às incidências do que se passa no campo de jogo onde individual ou colectivamente, os atletas evoluem dando largas à suas maiores ou menores capacidades para mostrarem as suas valências, habilidades, saber e força em prol do jogo, da equipa e claro, do espectáculo. As emoções que se transmitem do interior do recinto de jogo para o exterior quase atingem o estatuto de êxtase quando falamos de futebol e tratando-se de um jogo entre equipas rivais, o clima vivido dentro de um estádio de futebol acerca-se de autênticas disputas medievais nas quais os exércitos eram compostos pelos mais diferenciados extractos da sociedade. Não é à toa que estes torneios da era contemporânea são apelidados por alguns dirigentes de “guerras de mata-mata” – Felipe Scolari, recentemente dixit – salvaguardado claro está, o sentido figurado das palavras guerra e matar, o que prova serem os modernos descendentes dos torneios e justas de antanho. É comum usarem-se termos como defesa, ataque, conquista, disputa, confronto, etc., com vista a atingir a glória da vitória e a derrota, com mais ou menos honra, dos vencidos. Nestas “guerras” que se disputam por todo o planeta, a contenda entre os oponentes, à guisa de modernos infantes e cavaleiros que defendem os seus feudos, sob o olhar atento de “fidalgos” e “plebe” cegos seguidores dos seus brasões, podemos ver os resquícios das disputas da fidalguia de antanho, nas quais não faltam as candidatas a donzelas que se aperaltam para ver e apoiar os seus heróis, que evoluem no campo de batalha. O espectáculo, transfere-se de dentro do terreno de jogo para a plateia de adeptos, sedentos de assistirem ao embate entre os seus e o adversário – elevado por alguns à categoria de inimigo – e a disputa passa para a bancada, chegando a complementar-se com batalhas de bastidores. Os espectadores trocam a bola pelo uso do insulto, pelo abuso da provocação jocosa e gratuita e tantas vezes dos punhos; não poucas vezes, servem-se de tudo o que tenham à mão para manifestarem a sua ferocidade, dedicação e orgulho clubista numa autêntica demonstração de instintos violentos básicos, troglodíticos, potenciados pela impunidade que sentem pelo anonimato que a multidão enfurecida lhes confere. Ali no meio dos seus, qualquer trinca-espinhas se sente na pele de um super-homem, qualquer Veloso camoniano se transforma num virgiliano Eneias – até as frágeis ninfas coloridas se transformam por momentos em clones da Padeira de Aljubarrota e Joana d’Arc. Este espectáculo atinge o auge da loucura e quase histeria colectiva quando as massas que se batem são rivais da mesma terra, assumindo a peleja o nome de “Derby”, sendo que há um misto de tensão, nervosismos, paixão, no fundo uma amálgama de sentimentos, expectativas e convicções, frustrações reprimidas dentro do peito de cada um dos participantes que se libertam no momento proporcionado por esse orgasmo colectivo que é o golo.

Esta semana, temos “Derbyes”. Um a norte de cariz mais regional, entre minhotos, Guimarães e Braga e outro no centro, entre os lisboetas Sporting e Benfica. Embora no fundo não passem de disputas de alecrim e manjerona, faço votos para que estes embates sejam, acima de tudo, duas Justas nas quais os valores da verdade, da honra e respeito pelos adversários e público, sejam transmitidas pela boa interpretação das regras do jogo e claro, pela magia que os artistas consigam transpor no terreno de jogo, com a lealdade que se exige. Quanto aos espectadores, que se comportem com a grandeza com que os valores do espírito desportivo e a dignidade da espécie humana deveriam pautar a competição leal e positiva entre os seus pares. Estarei lá, entre a turba, para assistir ao espectáculo, não como interveniente de uma das partes, mas como árbitro atento aos desmandos dos que não sabem o valor e sentido da metáfora e assim cometem o dislate de dar o real sentido à palavra “guerra”, aplicando-a a um espectáculo que deveria ser de paz.

Ganhe quem merecer e a que a festa seja rija.


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