Carta aberta aos Bandidos
Por Ricardo Araújo Pereira, in Visão
Estimados bandidos,
De acordo com relatórios do Ministério da Administração Interna, a criminalidade dos gangs aumentou 460% em sete anos. Creio ser seguro afirmar que nenhuma outra actividade teve, em Portugal, um sucesso que sequer se assemelhe a este. Se alguma classe profissional tem levado a sério o apelo patriótico do Presidente da República para fazer um esforço no sentido de da o melhor se si ao País, é a vossa.
Não posso, no entanto, deixar de colocar fortes reservas à vossa última iniciativa.
É certo que a notícia correu o mundo, e é inegável que isso, juntamente com os êxitos de José Mourinho, contribui para prestigiar o nome de Portugal lá fora.Mas mobilizar 500 marmelos para assaltar uma praia é simplesmente estúpido. Com meio milhar de meliantes bem organizados, vocês podiam ter assaltado a agência sede da Caixa Geral de Depósitos e trazido o cofre-forte ao colo. Duzentos e cinquenta de cada lado e levavam aquilo em peso para casa.
A assaltar uma praia, parece-me óbvio que deveriam ter escolhido praias de gente rica, como a dos Tomates, a do Ancão ou as de Vilamoura. Num dia bom, talvez conseguissem palmar o helicóptero do Manuel Damásio.
Já a praia de Carcavelos, meus amigos, o que é que têm para roubar? Por mais que me esforce, não consigo deixar de imaginar a vossa reunião após o arrastão como uma cena patética do tipo:
Bandido: Muito bem, vamos lá dividir o produto do roubo desta tarde. Este bronzeador solar de factor 30 fica para mim. Mãozinhas, ficas com este par de raquetes. Aqui o tupperware de pataniscas de bacalhau é para o Zé Naifas. E os outros 497 dividem este tacho de arroz de tomate embrulhado em papel de jornal.
RÍDICULO, não vos parece? Sei que a minha opinião de leigo, provavelmente, conta pouco, mas não faria mais sentido dividirem-se em grupos de 50 (que já assustam) e assaltarem dez praias em vez de uma? É uma questão de aritmética simples.
Se me permitirem a observação, estou convencido de que vocês, bandidos nacionais, são como os empresários portugueses – e digo isto sem pretender ofender-vos de modo algum. Têm iniciativa, sim senhor, mas falta-vos a visão estratégica e, sobretudo, formação.
Pois não é evidente que os vossos negócios se desenvolvem menos bem na praia do que, digamos, no campo? Mantém-se o contacto com a natureza e o trabalho ao ar livre – que, pelos vistos, vocês tanto prezam - , e tem duas vantagens que entendo como fundamentais: primeira, há muito mais coisas para roubar; segunda, eu vou à praia de vez em quando, mas não jogo golfe.
Pensem lá bem nisso e continuação de bom trabalho.
Um abraço a todos do
Ricardo
PS – Não sei qual de vocês ficou, aqui há tempos, com o meu auto-rádio. Se ainda não foi vendido, uma dica: Lá dentro ia um CD do Sérgio Godinho, o Rivolitz. Tenham isso em atenção na altura de fazer o preço, porque é um belo álbum ao vivo.
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